“A Finlândia tem as melhores eleições do mundo – pense por quê”. No ano passado, esse slogan foi o ponto central de uma campanha veiculada nos meses que antecederam as eleições parlamentares do país, realizadas em abril. Personagens conhecidos foram porta-vozes da iniciativa, criada para reforçar a importância do senso crítico na vida dos finlandeses – e da própria democracia. A mensagem de fundo era clara: qualquer que fosse a escolha dos eleitores, ele não podia se basear em fake news.
As notícias falsas, uma ameaça à vida em sociedade de escala planetária, têm assolado a vida dos brasileiros em particular. Elas sempre existiram, mas sua disseminação ganhou outra proporção com as redes sociais e os aplicativos de mensagens, como o WhatsApp. Como o Brasil poderia enfrentar esse problema? Não há resposta fácil, mas a Finlândia, com iniciativas simples, mas eficientes, mostra que um outro caminho é possível.
Como o Scandinavian Way contou em 2019, a abordagem finlandesa não exige tecnologias complexas nem qualquer ferramenta avançada de inteligência artificial. Em linhas gerais, o que os finlandeses têm feito é ensinar o pensamento crítico já a partir das escolas para que a sociedade não sofra com decisões tomadas a partir de informações falsas. Crianças e jovens aprendem na prática a não confiar em qualquer informação que leem nas redes sociais ou em seus grupos de mensagens.
Em 2014, a Finlândia lançou cursos que ensinam métodos para identificar e combater as fake news. As aulas são uma espécie de manual sobre como identificar manipulações de imagens e vídeos, intimidação e perfis falsos por meio do volume de postagens, inconsistência na tradução e falta de informação pessoal.
Perseguir jornalistas dá cadeia no país
Diferentemente do que supõem muitos brasileiros, isso não significa duvidar do jornalismo profissional (“da mídia”, como costumam dizer os detratores). Ao contrário: os finlandeses lideram o ranking de confiança na imprensa, segundo o Digital News Report 2019, estudo realizado em 38 países pelo Reuters Institute. Entre os finlandeses, o índice geral de confiança nas notícias é de 59%. Além disso, como registrou o Scandinavian Way, os tribunais do país começaram em 2018 a condenar cidadãos envolvidos em ataques e intimidações on-line contra jornalistas, seja em ações isoladas, seja em campanhas coordenadas. Atitudes como essas podem dar cadeia.
Outro relatório, publicado no último mês de novembro, mostra que os finlandeses são o povo mais resistente a crer em boatos e mentiras espalhados nas plataformas digitais. Criado em 2017 pelo Open Society Institute, da Bulgária, o estudo, batizado de Media Literacy Index, apurou a “imunidade” às fake news em 35 países. O Brasil não fez parte da pesquisa.
Por trás de tudo está a educação. O sistema educacional finlandês, centrado no princípio da autonomia dos professores, que são bem treinados e bem remunerados, é considerado um dos melhores do mundo. O currículo das escolas conta, desde 2016, com ensino sobre mídia, imprensa e informação, contou o jornal britânico The Guardian em reportagem publicada em janeiro e mencionada nesta semana em artigo da Folha de S. Paulo. Deve-se combater não a imprensa, o jornalismo ou os jornalistas, ensinam os finlandeses, e sim ensinar às crianças a detectar quais fontes de informação merecem crédito e quais precisam ser tratadas como o que de fato são: usinas de mentiras.